A gente lê: A Autobiografia de Alice B. Toklas
A Autobiografia de Alice B. Toklas foi escrito por Gertrude Stein. Hum? Percebeu a pegadinha? Pois é. Apesar de ser intitulada "autobiografia", a obra não pode ser rigidamente considerada como tal, já que não é narrada pela biografada. E é aqui que está toda a graça da história.
Calma, que vou tentar explicar do começo.
A americana Gertrude Stein foi, talvez, tão importante para a literatura como para a pintura mesmo sem jamais ter sido artista plástica. Isso porque ela se mudou bem jovem para Paris e, juntamente com o irmão, começou a comprar por mixaria quadros de pintores que até então eram desconhecidos: Cézanne, Matisse, Picasso... Sua casa, situada no moderno bar de Montmartre (o mesmo de Amélie Poulain e do Moulin Rouge :p ) virou então um ponto de encontro de grandes artistas e aí, voilá, estouraram não só os cubistas, como também grandes autores no nível de Hemingway, T. S. Elliot, Jean Cocteau.
E é essa rotina de vai e vem de gênios que está descrita na obra abordada por este post.
Soa familiar para você? Pois se trata exatamente do mesmo ambiente retratado nas "voltas no tempo" do filme Meia-Noite em Paris, de Woody Allen. Lembra que o personagem de Owen Wilson entrega seus manuscritos a uma senhora simpática? Então, é Gertrude!
Revi alguns trechos do longa depois que terminei A Autobiografia... só para poder comparar e foi bem divertido. O Picasso descrito por Gertrude é muito mais afável do que o emburrado personagem do filme; já o Hemingway do cineasta é muito mais bacanudo do que o oportunista homem de Alice/Gertrude.
Mas, afinal, quem diabos era Alice B. Toklas? Bom, ela é mais uma americana que chega em Paris e cai bem no meio do buchicho, passando a ser secretária e também companheira de Gertrude. Há boatos de que formavam um casal, embora o posfácio da edição linda, de capa dura e cheia de detalhes da Cosac Naify, escrito por Silviana Santiago, defenda a ideia de um "casamento bostoniano" - lar onde duas amigas vivem como irmãs, sem uma presença masculina.
Tanto faz. A questão aqui é por que teria Gertrude invocado a voz de Alice para contar a sua própria história? Não sei. Mas gosto muito da hipótese sugerida por minha amiga Karina: "a escritora queria se elogiar". Duvida? Vejam só esses trechos de pura "modéstia" que selecionei (não se esqueçam que, no duro, trata-se de Gertrude falando sobre si):
"Os três gênios de quem quero falar são Gertrude Stein, Picasso e Alfred Whitehead. Conheci muitas pessoas importantes, conheci várias grandes pessoas, mas só conheci três gênios de primeira classe"
"(Gertrude) não entendeu por quê, uma vez que que a escrita era toda tão clara e natural, caçoavam e se enraiveciam do seu trabalho"
Isso que é autoestima, né? Tanto que acho até que incomoda um pouco. Gertrude acredita ter sido a precursora da literatura moderna. Hum... Não quero avançar em assuntos que desconheço - não li suas outras obras-, mas sei que é bem pouco mencionada em comparação aos seus contemporâneos como Virginia Woolf (ok, aqui me torno suspeita) ou mesmo Hemingway.
Enfim, fato é que quanto mais a narrativa de A Autobiografia ... se distanciava das fofocas sobre os artistas, mais meu interesse se dissipava. No fim, achei o livro cansativo, mas terminei com uma vontade danada de ler Três Vidas, provavelmente a obra-prima de Gertrude - mesmo que seja para fechar e dizer "ah, ela não é tudo isso que pensava" :p
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