A (não) literatura feminina segundo Lygia Fagundes Telles e Rosa Montero
Lygia Fagundes Telles é uma escritora brasileira de 93 anos. Seu primeiro livro assumido é Ciranda de Pedras, de 1954. Desde então, publicou mais três romances, incontáveis contos e até roteiro de cinema. Estudou Direito no Largo São Francisco, educação física, praticava esgrima e, de acordo com depoimento do escritor Ricardo Ramos, era uma das únicas mulheres a fumar em público na década de 1940.
Rosa Montero é uma escritora espanhola de 65 anos. A primeira obra é de 1976, mas continua na ativa e acaba de lançar o ainda inédito no Brasil La Carne. É jornalista no tradicional El País e recebeu diversos prêmios por seu trabalho nessa área.
Por que estou comparando as duas? Porque ambas são autoras de peso e que já vi se declararem contra o termo 'literatura feminina'. Vejam o que elas falam sobre o assunto:
Lygia Fagundes Telles no programa Roda Viva em 1996
"Eu não faço distinção hoje de literatura feminina e literatura masculina. Eu não faço esse divisor de água. A divisão de águas está em relação à qualidade. Há escritores que escrevem bem e escritoras que escrevem bem. Escritores que escrevem mal e escritoras que escrevem mal."
Apesar disso, Lygia acredita que a opressão às mulheres acabou gerando uma particularidade no ponto de vista:
"A literatura escrita pela mulher tem certas características dentro da nossa condição mesmo, há um subjetivismo talvez maior. Eu vejo nesses diários de capas acetinadas com pombinhas, coraçõezinhos pintados, eu vejo o início desta literatura intimista, subjetiva. Seria a fonte primária das mulheres tentando se dizer, tentando se explicar, tentando desembrulhar. A mulher é mais embrulhada do que o homem, porque ela foi obrigada a ser mais embrulhada. Aqui no Brasil, a mulher calada, ela sai e vai para a cozinha fazer goiabada. Tanto é que eu chamo, sem ironia, mulher-goiabada. Mamãe quis ser cantora, tinha uma voz linda, mas o pai achava que aquilo não era uma condição de uma moça fina da alta sociedade, então ela casou-se, mas ela foi frustrada na sua primeira vocação e foi fazer doces de goiaba."
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Rosa Montero no livro de ensaios A Louca da Casa
"Quando uma mulher escreve um romance protagonizado por uma mulher, todo mundo considera que está falando das mulheres; mas se um homem escreve um romance protagonizado por um homem, todo mundo considera que está falando do gênero humano."
A espanhola acredita que o fato de um escritor viver no campo e outro viver em uma cidade grande interfere muito mais no ponto de vista do que a questão de gênero, mas vê com bons olhos o aumento de livros escritos por mulheres invadindo o mercado:
"E já é hora de os leitores homens se identificarem com as protagonistas mulheres, da mesma maneira que durante os séculos nós nos identificamos com os protagonistas masculinos, que eram nossos únicos modelos literários; porque essa permeabilidade, essa flexibilidade do olhar nos tornará a todos mais sábios."
Você acha que devemos restringir mulheres que escrevem à categoria de 'literatura feminina'? Deixe sua opinião nos comentários. E se quiser se aprofundar no tema mulheres e literatura, recomendo fortemente a leitura do ensaio Um Teto Todo Seu, de Virginia Woolf.
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