Um alerta para você que vai começar A Viagem, de Virginia Woolf, pela edição da Novo Século: deixe o prefácio por último. Sim, os textos introdutórios - um de Antonio Bivar, outro da sobrinha da autora - revelam o fim do livro! Ah, gente, não pode!
Pessoalmente, corro de spoilers porque acho que alteram a minha expectativa de leitura. Com eles, começa-se um trecho com o pressuposto da reviravolta que vai encerrá-lo, o que, creio, subverte a proposta do autor.
Enfim, desabafo à parte, A Viagem é o primeiro romance da inglesa, que trabalhou nele por 11 anos até finalmente publicá-lo em 1915, aos 33 anos. Apesar do ineditismo, Virginia já era Virginia - o que, para mim, significa ser uma das cinco maiores entre todos os autores que conheço. Já está tudo ali: os fluxos de consciência, a atenção aos detalhes, o feminismo e a crítica ao comportamento da elite inglesa.
Tá bom, tá bom. Mas e a obra? Hum... Difícil compactar. Já escrevi e apaguei algumas vezes aqui sem conseguir concordar comigo mesma.
Vamos lá, bem resumidamente.
Eu diria que é a história de duas inglesas, a quarentona Helen Ambrose e a inocente sobrinha Rachel, que cruzam o oceano para passar as férias em uma vila de veraneio de algum país subdesenvolvido da América. Segundo Antonio Bivar, o romance se passaria no Brasil. Mas não consigo concordar com o estudioso, porque Virginia descreve um lugar onde os criados falam espanhol e o outono acontece em março. Portanto acho mais assertivo dizer que Santa Marina é ficção.
Ok. Um enredo de uma viagem não parece nada demais. Só que o tempero mesmo está nos personagens que vão pipocando ao longo da trama.
Primeiro, temos os Dalloway. Isso mesmo, onze anos antes de dar nome a um romance fenomenal, Mrs. Dalloway e o marido aparecem pegando uma breve carona em A Viagem! O casal faz um trechinho do percurso de navio com os Ambrose, o suficiente para perturbar a vida de Rachel, e, quando partem, Virginia vem com essa maravilhosa definição sobre despedidas:
"Uma sensação de vazio e melancolia os dominavam; sabiam em seus corações que aquilo tinha acabado e que se tinham separado para sempre, e a consciência disso provocava neles uma depressão bem maior do que se justificaria pelo tempo que se conheciam."
Aí tudo entra na estabilidade, quando, quase na página 200, Helen e Rachel, já em Santa Marina, encontram um hotel cheio de outros ingleses de férias. É sério! Acho que jamais havia lido uma história com uma inserção tão brusca de um novo - e fundamental - núcleo. Confesso até que tive uma certa dificuldade para me adaptar com tanta gente nova.
É aí que, mais uma vez, nossas personagens principais vão passar por experiências e influências definitivas que vão mudar o rumo das coisas. O que me faz pensar que, no fundo, A Viagem fala sobre transição, entradas e saídas. Sobre encontros, as transformações que eles nos causam e, sobretudo, como a vida continua apesar das partidas.
Estou muito tentada a continuar falando, porque uma das frases mais bonitas que já li está no trecho final do livro, mas melhor não estragar as surpresas que só terão se encararem o romance por vocês mesmos.
Vamos falar da parte ruim? A edição da Novo Século
O meu exemplar faz parte de um box de seis livros da Virginia Woolf que ganhei de uma amiga em 2012.
Meu problemas começaram quando peguei A Viagem pela primeira vez e percebi que várias páginas estavam em branco. Não preciso nem dizer que o box vinha embalado por plástico e, portanto, era um defeito não aparente. Depois de um empurra-empurra entre editora e loja virtual onde a compra foi feita (Submarino), consegui trocar o livro - um ano e dois meses após o primeiro contato.
Ufa!
Eis que começo a ler e não pude deixar de perceber diversos errinhos de revisão durante a obra, principalmente nos capítulos finais. Não é possível! Creio que o revisor estava cansado e acabou pulando umas páginas. São errinhos bobos, mas meio intoleráveis num título que está custando entre R$ 25 e 37 no mercado, não acham?
Leia mais sobre Virginia Woolf no Shereland:
A gente lê: Mrs. Dalloway
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